Vendas online de bebidas alcoólicas aumentam até 800% na quarentena

27/04/2020

Com o isolamento social e o fechamento de bares e restaurantes, as vendas online de bebidas alcoólicas tiveram um boom durante a quarentena. A mudança de hábito do consumidor elevou em até 800% o volume de pedidos em empresas de e-commerce e delivery.

É o caso do marketplace Cerveja Artesanal Store, que verificou a escalada a partir de 17 de março. O faturamento mensal saltou de cerca de R$ 12 mil, em janeiro e fevereiro, para quase R$ 108 mil. O tíquete médio, que começou o ano em R$ 77, agora supera R$ 220.

"Foi um pico que nunca tinha visto", afirmou o fundador da Cerveja Store, Edmir Filho. "As principais empresas de cerveja têm redes de distribuição bem formadas, dominam os supermercados. O cervejeiro artesanal vende na sua cidade, no bar do amigo. Ele vive geralmente com essa venda local e um pouco on-line", explicou.

A procura por parte de produtores de cervejas artesanais cresceu, e o portfólio da empresa quase dobrou. Ao longo da quarentena, Filho cadastrou 40 novas marcas e 200 rótulos. Com mais opções e tempo, a permanência dos consumidores no site tem sido mais longa.

O paulista Renato Alves, de 33 anos, adquiriu o hábito de pesquisar sobre degustação e harmonização. Ele está prestes a concluir um curso de sommelier e administra a página ‘Na Onda do Malte’, na qual produz conteúdo sobre cervejas artesanais.

Acostumado a frequentar bares, o gerente de canais se adaptou à nova forma de consumo online. Nas últimas três semanas, ele gastou R$ 700 em cerveja – mais ou menos o dobro do que de costume. "Começamos a pensar em como ter uma experiência em casa, experimentar novos sabores", disse. "Já fazia compras online de outros produtos e vou manter, com certeza, com a cerveja", afirmou.

Na startup Brindisi Vinhos, as vendas online aumentaram em 600% a partir de 16 de março, uma semana antes do fechamento de sua loja física, que respondia por 70% do faturamento. O número de clientes quadruplicou. E as visitas ao site pularam de 10 mil, em média, por mês, para 100 mil.

O Clube do Malte registrou altas de 50% e 70% nas vendas em março e abril respectivamente. As assinaturas cresceram 56% em relação ao primeiro bimestre. A empresa verificou um comportamento voltado ao estoque, em especial com a compra de kits com mais cervejas. Já na Evino, o pedidos saltaram 20% entre fevereiro e março, em comparação ao mesmo período de 2019.

De acordo com Carla Oliveira, co-fundadora da Brindisi, o cenário está mudando a cada semana e as empresas devem buscar o equilíbrio em três pilares: qualidade do produto, bons preços e agilidade de entrega.

"O novo normal será as pessoas experimentarem algo que esteja próximo, já que sua casa é este novo centro de convivência. As interações pelas mídias sociais fazem os relacionamentos se estreitarem e um conjunto novo de encontros, happy hours e bate-papos podem ser realizados no momento do cliente", afirmou.

O servidor público Renne Barros, de 31 anos, por exemplo, passou seu aniversário na companhia de uma garrafa de vinho e um bolo individual - também encomendado. Sem familiares no Rio de Janeiro, onde mora, a solução foi realizar chamadas de vídeo com os parentes e amigos.

"Passei a noite fazendo conferência, ligando de um para o outro. Enquanto isso, uma garrafa de vinho foi embora", contou Barros, que comprou 28 garrafas de vinho via ecommerce para a quarentena. O servidor mora ao lado de um supermercado, mas as idas até o estabelecimento têm ficado cada dia mais raras. As promoções online de kits o convenceram a testar o serviço.

Para Jessica Gordon, CEO da Bebida na Porta, uma startup de entregas de São Paulo, os pedidos virtuais devem virar tendência mesmo após a quarentena. Sua empresa cresceu 250% do ano passado para cá e, somente nesse período, a demanda subiu 80%. A previsão é de mais de 7 mil pedidos em abril, frente a 3.800 em março.

"Essa quarentena só acelerou ainda mais esse processo de crescimento do pedidos online", disse Gordon. Por conta disso, sua empresa já está criando um aplicativo próprio – hoje tem parcerias com empresas de marketplace como Ifood – e pretende expandir seus pontos de distribuição.

Mesmo trabalhando com todo tipo de bebidas, a cerveja lidera os pedidos. "Cerveja e cigarro é o que chama o cliente a conhecer a gente numa emergência, conveniência ou falta de tempo", salienta a CEO.

O boom do e-commerce, no entanto, não representa a realidade de todas as empresas de bebidas. Pesquisa da Abrabe (Associação Brasileira de Bebidas) mostra que, na segunda quinzena de março, houve queda de 52% do faturamento do setor. Entre as empresas, 40% relataram retração nas vendas depois do isolamento social.

Para contrabalancear, os empresários têm investido em soluções online. A sommelier e consultora Gabriela Bigarelli passou a atender por Instagram em meio ao confinamento. Ela também aposta em lives e novos formatos para ampliar o conhecimento do consumidor e convertê-lo em vendas.

Outro desafio é criar uma proximidade com um público que vem se modificando. Dados das empresas mostram que perfis femininos e de idade mais avançada estão aderindo mais à tecnologia e ampliando um nicho antes dominado por pessoas entre 25 e 45 anos, em sua maioria homens. Mesmo esse grupo tem sido cada vez mais fiel.

O publicitário Gabriel Collese, de 35 anos, acredita que a nova onda do momento vai se tornar uma realidade. Na república onde mora com nove pessoas, em São Paulo, as compras de bebidas online viraram recorrentes para baterem papo enquanto assistem a shows em lives ou em conversas por vídeo com amigos distantes.

"A partir de agora, não me vejo mais entrando no mercado para comprar bebidas, mesmo após essa crise", afirmou Collese.

Fonte: Época Negócios, escrita por Rodrigo Castro