Maria Cevada: Falamos com a mestre cervejeira especialista em cerveja e em quebrar tabus

11/07/2018

É para mulheres que gostam de cerveja? “Não. É para quem gosta de cerveja boa!” Não foram poucas as vezes que a carioca Amanda Henriques foi questionada sobre o nome do seu site e até sobre o layout ‘delicado’ que escolheu para ele, mas ela sempre acreditou que poderia transformar um estereótipo pejorativo em uma quebra de tabu e assim o Maria Cevada se tornou uma das maiores referências da cena cervejeira nacional – para homens e mulheres!

Há sete anos atrás, cerveja artesanal ainda era um nicho desconhecido e bastante inexplorado no país. Em geral, alguns bares, pubs e lojas especializadas faziam a alegria dos entusiastas. Poucos rótulos nacionais se destacavam no mercado e predominava a oferta de marcas tchecas, belgas e alemãs. Mesmo assim, Amanda decidiu dar vazão ao seu mais recente hobby, escrevendo sobre suas experiências. As referências sobre o assunto na web na época, como o Goronah e o Brejas, eram mais voltadas para aficcionados, que já entendiam perfeitamente ‘porque uma moagem muito fina aumenta a extração de taninos que podem causar um sabor adstringente na cerveja’! Faltava alguém que falasse a língua dela na época.

Amanda, que até seus 19 anos dividia ‘geladas’ nos bares de Botafogo para socializar com os amigos, havia se entusiasmado com algumas cervejas de trigo, mas levou um choque quando provou sua primeira IPA em uma degustação. “Era muito amarga. Não era possível que aquilo fosse cerveja. Questionei meus amigos e eles falaram que um dia meu paladar entenderia aquilo e eu não iria querer mais outra coisa”. Decidiu, então, investir no aprendizado do paladar.

Ela lembra que seus primeiros posts a entrarem no ar não tinham mais do que mil visualizações por mês. Aos poucos, contudo, foi ganhando espaço na cena cervejeira, passando a ser figurinha carimbada nos principais eventos e feiras do país. Alocou parte das suas economias num curso de sommelière no Instituto da Cerveja Brasil – o primeiro realizado no Rio de Janeiro – e começou a rodar o país para conhecer pessoalmente a operação das fábricas e as técnicas dos mestres cervejeiros em ação.

O esforço valeu a pena! Hoje, com mais de 80 mil seguidores no Instagram e 9 mil inscritos em seu canal no YouTube, o Maria Cevada é certamente referência absoluta no mercado de cerveja artesanal nacional. Um mercado que, aliás, nem de longe lembra o ambiente minguado de cinco anos atrás: com 679 fábricas, 37% a mais do que 2016, o Brasil ocupa já o terceiro lugar mundial na produção e consumo de cervejas. Detalhe: a venda de artesanais cresceu ano passado mais de 14%, enquanto a de cervejas tradicionais caiu 10%.

Encontramos recentemente Amanda para um bate papo no Poderoso Buteco, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Confira abaixo os principais trechos da entrevista:

Hypeness – O Maria Cevada foi motivado pelo fato de você sentir que as mulheres àquela altura eram excluídas do universo cervejeiro?
Amanda – Queria falar com pessoas que, como eu, estavam começando a gostar de cerveja artesanal, mas não tinham referências técnicas e se sentiam excluídas por não terem noção por exemplo sobre o que era caramelização do malte. Daí veio a auto-censura na cabeça: ‘será que vai dar certo uma mulher falando de cerveja?’. Resolvi comprar a briga!

Hypeness – As pessoas tendem a imaginar que você bebe todo dia? Como é sua rotina?
Amanda – Atualmente, recebo em média 15 rótulos por semana para degustar. Em geral, nos dias de semana, procuro beber uma cerveja por dia no jantar. Aos finais de semana, bebo cerveja nos eventos e feiras em que sou convidada. Pode parecer muito, mas lhe garanto que bebo hoje muito menos do que eu bebia quando ainda não conhecia as cervejas artesanais.

Hypeness – Como assim?
Amanda – Não dá para tomar uma caixa de cerveja artesanal numa noitada só, como se faz com a cshamada ‘cerveja comercial’, nem é essa a proposta. A ideia é beber menos e melhor.

Hypeness – Muita gente evita tomar cerveja artesanal por considera-la cara. O que você acha disso?
Amanda – É um engano. Você consegue comprar uma boa cerveja artesanal por 12 a 15 reais. Garanto que duas a três garrafas – custo igual ou até menor que uma caixa de latinhas – vão render e satisfazer muito mais.

Hypeness – Com o sucesso do site, você conseguiria hoje ‘viver só de cerveja’?
Amanda – Talvez, mas não é o que eu quero. Cerveja artesanal é um hobby ao qual quero continuar me dedicando, mas sem ter a pressão de um trabalho formal. Hoje dedico cerca de cinco horas por dia ao site e tudo que está relacionado a ele, sem contar os finais de semana. Está bom demais!

Hypeness – Como você avalia o mercado de cerveja artesanal no país hoje?
Amanda – É um mercado que vai continuar crescendo. Acho, inclusive, que menos em volume e mais em qualidade. Porém, ainda é preciso entender e falar a língua do público leigo que, em muitos casos, continua não tendo o tratamento adequado e se sentindo excluído, como na época em que comecei o site.

Hypeness – Ainda acha que há algum preconceito velado em relação às mulheres?
Amanda – Temos sommelières e mestres cervejeiras reconhecidas internacionalmente, porém creio que assim como ocorre na maior parte das áreas, a mulher tem que provar duas vezes sua competência em tudo.

Hypeness – Por fim, quais são seus novos projetos?
Amanda – Lancei recentemente uma loja online em parceria com o Colab 55 com uma série de produtos e acessórios com estampas desenvolvidas com exclusividade pelos designers responsáveis pelos rótulos de cervejas artesanais. Além disso, estou junto com a BALL na campanha #vadelata, cuja proposta é incentivar o consumo de latas de alumínio, que além de mais amigáveis em relação ao meio ambiente, preservam mais o aroma e o sabor.

Fonte: Hypness